Carolina Maria de Jesus por Lorena Lacerda - Rádio BSD

A escritora Carolina Maria de Jesus também foi uma compositora, cantora e gravou um disco na “RCA Victor”, uma das maiores gravadoras da época, em 1961. O disco é raríssimo e com apenas um exemplar à venda na discogs por R$1.066 reais.

Todas as composições foram de autoria da artista, entre sambas e marchinhas. As letras expressam a sua realidade pobre, na favela, onde aborda questões sócio-raciais, violência de gênero, fome, alcoolismo, desigualdades, enfim, os fardos de ser mulher negra na sociedade.
Na música “Rá, Ré, Ri, Ró, Rua”, faixa 1 (lado A), a composição relata um marido boêmio, que chega de madrugada, e quebra seus pertences, a maltratando.

E ela, no auge da sua decisão de romper com ciclos de violências, diz: “Re, Re´, Ri, Ró, Rua, você vai embora que esta casa não é sua”.Na letra de “Vedete da favela”, faixa 2 (lado A), a compositora relata uma mulher favelada que de forma repentina adquiriu fama e prestígio com aparição no jornal, viajou para os Estados Unidos e comprou muitos vestidos: “Salve ela, oi, salve ela, oi, salve ela a vedete da favela”. Na música, onde “vedete da favela” se chama Maria, podemos observar uma alusão do que poderia ter sido com a sua vida, se o racismo tivesse reconhecido em vida uma das maiores escritoras do Brasil e do mundo cuja a sua principal obra é “O Quarto de despejo”.
Na letra de “pinguço”, faixa 3 (lado A), ela relata um companheiro que sofre de alcoolismo, agride sua companheira e seus filhos: “O pinguço chega em casa, não compra nada e quer comer, bate na mulher e bota os filhos pra correr, quem casa com pinguço vai sofrer… eu é que não sirvo para ser mulher de pinguço.”
Na música “O pobre e o rico”, faixa 5 (lado A), ela aborda as diferenças sociais, negação de direitos e desordem social ocasionadas pelas elites políticas: “Pobre só pensa no arroz e no feijão, pobre não envolve nos “negócio” da nação, pobre não tem nada com a desorganização”.

Por fim, eu considero o disco uma experiência sonora do livro “O quarto de despejo”, publicado em 1960, obra prima e de reconhecimento internacional da artista